No mundo jurídico, poucos temas geram tanta confusão entre estudantes, profissionais e até mesmo entre aqueles que se preparam para concursos públicos quanto a distinção entre decadência e prescrição.
Afinal, ambos os institutos, decadência e prescrição, envolvem prazos, perda de direitos e, muitas vezes, surgem associados à ideia de punição pela inércia. No entanto, suas diferenças são fundamentais, e desconhecê-las pode gerar graves equívocos na prática jurídica!
A prescrição está ligada à perda do direito de exigir judicialmente determinada prestação, enquanto a decadência leva à extinção do próprio direito. É o clássico exemplo: enquanto na prescrição o direito material ainda existe, mas não pode mais ser exigido, na decadência o direito simplesmente desaparece do ordenamento jurídico.
Decadência e prescrição: Tudo o que você precisa saber
A decadência e prescriçãoa são institutos jurídicos de extrema importância, presentes no Direito Civil, Direito Tributário e em diversas outras áreas do Direito.
Embora muitas vezes confundidos, a decadência e prescrição possuem características e efeitos distintos, que impactam diretamente no exercício dos direitos e na extinção das ações judiciais.
Neste artigo, vamos aprofundar os conceitos, diferenças, aplicações e exemplos práticos de prescrição e decadência, trazendo uma visão completa e atualizada, essencial para estudantes, profissionais do Direito e candidatos a concursos públicos.
O que é Prescrição?
A prescrição é a perda do direito de ação em razão do decurso do tempo. Em outras palavras, ela impede que o titular de um direito exerça sua pretensão judicial depois de transcorrido um prazo determinado pela lei.
Porém, é importante entender que a prescrição não extingue o direito em si, mas sim a possibilidade de cobrá-lo judicialmente.
Pressupostos e causas de impedimento, suspensão e interrupção
O prazo prescricional pode sofrer causas que modificam seu curso:
- Impedimento: O prazo nem começou a correr, porque existe uma causa que impede seu início.
- Suspensão: O prazo está correndo, mas “congela-se” enquanto a causa suspensiva estiver presente.
- Interrupção: O prazo é reiniciado do zero após a causa que o interrompeu cessar.
Segundo Gagliano e Pamplona Filho (2019, p. 227):
“No impedimento, o prazo nem chegou a correr, enquanto na suspensão, o prazo, já fluindo, ‘congela-se’, enquanto pendente a causa suspensiva.”
A diferença entre interrupção e suspensão é fundamental: na suspensão, o prazo para e volta a contar de onde parou; na interrupção, o prazo para e reinicia do zero.
Além disso, de acordo com o artigo 202 do Código Civil, a interrupção pode ocorrer somente uma vez nas hipóteses específicas previstas entre os incisos I a VI.
Início e término dos prazos da prescrição
O artigo 189 do Código Civil estabelece que o prazo para prescrição e decadência começa a contar a partir do momento em que o direito foi violado, ou seja, quando o titular tem conhecimento efetivo da violação.
Com isso, salvo causas de impedimento, suspensão ou interrupção, o prazo final de prescrição será de até 10 anos (art. 205, CC), salvo disposição em contrário.
Já o artigo 206 do Código Civil estabelece prazos prescricionais mais curtos, que variam de 1 a 5 anos, conforme o tipo de ação:
- 1 ano (§1º)
- 2 anos (§2º)
- 3 anos (§3º)
- 4 anos (§4º)
- Até 5 anos (§5º)
Uma decisão importante do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no EResp nº 1.281.594 reforçou que o prazo prescricional para reparação civil contratual é de 10 anos.
Em que casos a prescrição não ocorre?
No ordenamento jurídico brasileiro, a prescrição não corre sempre que o direito estiver protegido por causas específicas que impedem, suspendem ou interrompem a sua contagem. Para compreender essas hipóteses, é necessário observar atentamente o disposto nos artigos 197 a 204 do Código Civil.
Causas que impedem ou suspendem a prescrição
O Código Civil estabelece as situações em que a prescrição simplesmente não corre. Isso significa que o prazo prescricional ainda não teve início ou está “congelado”, sem que o tempo decorrido seja computado, até que a causa cessar. São elas:
- Art. 197 – Não corre a prescrição:
- Entre os cônjuges enquanto durar a sociedade conjugal;
- Entre ascendentes e descendentes durante o poder familiar;
- Entre tutelados ou curatelados e seus tutores ou curadores, enquanto durar a tutela ou curatela.
- Art. 198 – Também não corre a prescrição:
- Contra os incapazes (conforme artigo 3º do Código Civil);
- Contra ausentes do país em serviço público da União, Estados ou Municípios;
- Contra quem estiver servindo nas Forças Armadas em tempo de guerra.
- Art. 199 – Não corre a prescrição:
- Enquanto pendente condição suspensiva;
- Enquanto não vencer o prazo;
- Enquanto pendente ação de evicção (quando o comprador perde a posse em virtude de decisão judicial que reconhece direito de terceiro).
- Art. 200 – Não corre a prescrição de ações originadas de fatos que precisam ser apurados em juízo criminal antes da sentença definitiva.
- Art. 201 – A prescrição suspensa em favor de um dos credores solidários só aproveita aos outros se a obrigação for indivisível.
Causas que interrompem a prescrição
Diferentemente do impedimento e da suspensão, que fazem o prazo “congelar”, a interrupção implica que o prazo prescricional recomeça do zero, ou seja, sua contagem é reiniciada após cessar o motivo da interrupção. O artigo 202 do Código Civil prevê as seguintes hipóteses:
- Por despacho do juiz, mesmo que incompetente, que ordenar a citação, desde que seja promovida dentro do prazo e da forma legal;
- Por protesto, nas mesmas condições;
- Por protesto cambial;
- Pela apresentação do título de crédito em juízo de inventário ou concurso de credores;
- Por qualquer ato judicial que constitua o devedor em mora;
- Por qualquer ato inequívoco, ainda que extrajudicial, que importe reconhecimento do direito pelo devedor.
Além disso, vale destacar:
- A interrupção da prescrição pode ocorrer apenas uma vez;
- Pode ser promovida por qualquer interessado;
- A interrupção por um credor não aproveita aos outros, salvo se forem solidários;
- A interrupção feita contra o principal devedor prejudica o fiador.
Diferenças entre impedimento, suspensão e interrupção
Embora o efeito final das causas que impedem, suspendem ou interrompem a prescrição seja o mesmo, a paralisação do prazo prescricional, existem diferenças essenciais a serem destacadas:
- Impedimento: o prazo nem chegou a correr. A contagem do prazo prescricional ainda não iniciou porque há uma causa que impede seu começo. Por exemplo, enquanto vigorar a sociedade conjugal entre cônjuges, não se inicia a prescrição de direitos entre eles.
- Suspensão: o prazo já começou a correr, mas fica “congelado” enquanto durar a causa suspensiva, e ao final desta, o prazo volta a correr de onde parou. Um exemplo é o prazo que fica suspenso enquanto o credor estiver incapacitado.
- Interrupção: o prazo para de correr, e quando a causa que a originou cessa, a contagem do prazo recomeça do zero, ou seja, o tempo que passou antes da interrupção não é computado.
Conforme ressaltam os juristas Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho (2019, p. 227):
“No impedimento, o prazo nem chegou a correr, enquanto na suspensão, o prazo, já fluindo, ‘congela-se’, enquanto pendente a causa suspensiva.”

O que é Decadência?
Diferentemente da prescrição, que extingue a pretensão, a decadência extingue o direito em si. Ou seja, na decadência, o direito deixa de existir após o decurso do prazo legal, não sendo possível nem mesmo exigir judicialmente aquilo que não mais existe.
Segundo o professor Anderson Schreiber:
“Há direitos, contudo, que são desprovidos de pretensão, direitos em que a exigibilidade não chega a surgir. São os direitos potestativos, que exprimem o poder do seu titular de interferir na esfera jurídica alheia por declaração unilateral de vontade. Os direitos potestativos não podem, por isso mesmo, ser violados, porque não dependem para a realização senão da vontade dos seus titulares, e, não podendo ser violados, não dão ensejo ao nascimento de pretensão.” (SCHREIBER, 2018, p. 301)
Dessa forma, a decadência incide justamente sobre esses direitos potestativos, que se perdem com o decurso do tempo, independentemente de exercício da pretensão.
Modalidades de decadência
- Legal: prevista expressamente em lei;
- Convencional: pactuada entre as partes em contratos.
No caso da decadência legal, o juiz pode declará-la de ofício, conforme artigo 210 do Código Civil. Já a decadência convencional não admite declaração de ofício, e sua renúncia é possível.
Entre os direitos potestativos que podem decair estão:
- Direito de arrependimento na retrovenda, que gera o cancelamento da compra e venda;
- Direito de preferência do locatário na compra de imóvel;
- Direito de preferência do lajeário (direito real de laje).
A decadência, portanto, pune o inerte em relação a um direito potestativo, enquanto a prescrição pune o inerte em relação à pretensão.
Alguns dispositivos do Código Civil que tratam da decadência:
- Art. 45: Decadência em 3 anos para anular constituição de pessoa jurídica;
- Art. 48: Decadência em 3 anos para anular decisões em pessoa jurídica;
- Art. 119: Prazo decadencial de 180 dias para anular negócio jurídico por conflito de interesses;
- Art. 178: Prazo de 4 anos para pleitear anulação do negócio jurídico em diversos casos;
- Art. 445: Prazos para garantia em vícios ocultos em compra e venda de móveis e imóveis;
- Art. 505: Prazo de 3 anos para o vendedor de imóvel resgatar o bem.
Além disso, outras legislações prevêem prazos decadenciais, como:
- Código de Processo Civil: Prazo decadencial de 2 a 5 anos para ação rescisória (art. 975);
- Código de Defesa do Consumidor: Prazo decadencial de 30 a 90 dias para reclamações (art. 26);
- Lei do Mandado de Segurança: Prazo decadencial de 120 dias (art. 23, Lei nº 12.016/2009).
Em que casos não ocorre a decadência?
No Direito Civil, a decadência é o instituto que determina o prazo fatal para o exercício de um direito potestativo, ou seja, um direito que se exerce contra outrem para modificar uma situação jurídica. Diferente da prescrição, que afeta a pretensão (o direito de agir), a decadência atua diretamente sobre o direito material.
Por regra geral, conforme o artigo 207 do Código Civil, os prazos decadenciais não se suspendem nem se interrompem. Isso significa que, uma vez iniciado o prazo de decadência, o seu curso não pode ser paralisado ou reiniciado. Logo, a perda do direito se dá de forma definitiva e irreversível quando o prazo é ultrapassado.
Exceções à regra da irreversibilidade do prazo decadencial
Assim como ocorre com quase todas as regras no Direito, há exceções importantes à proibição de suspensão ou interrupção da decadência, previstas no artigo 208 do Código Civil:
Art. 208 do Código Civil:
“Aplica-se à decadência o disposto nos arts. 195 e 198, inciso I.”
Esses artigos estabelecem situações nas quais o prazo decadencial não se inicia enquanto durar a causa impeditiva, sobretudo envolvendo incapacidade das partes.
- Artigo 195 do Código Civil:
“Os relativamente incapazes e as pessoas jurídicas têm ação contra os seus assistentes ou representantes legais, que derem causa à prescrição, ou não a alegarem oportunamente.” - Artigo 198, inciso I do Código Civil:
“Também não corre a prescrição:
I – contra os incapazes de que trata o art. 3º.”
Implicações práticas para a decadência
Dessa forma, a decadência não começa a correr contra os incapazes (pessoas que, por razões legais, têm sua capacidade reduzida ou suspensa para exercer certos atos da vida civil), enquanto durar a sua incapacidade.
Importante: Assim que a incapacidade cessa, ou seja, quando o indivíduo é plenamente capaz para o ato em questão, inicia-se o prazo decadencial para que o direito possa ser exercido dentro do período previsto em lei.
Isso significa que a contagem do prazo é postergada até o momento em que o incapaz possa efetivamente exercer o direito.
Decadência convencional: pactos que modificam o prazo
Outra exceção relevante à rigidez dos prazos decadenciais é a possibilidade de convenção entre as partes, ou seja, por meio de negócio jurídico processual, as partes podem acordar prazos diferentes dos legais para o exercício de direitos potestativos.
Isso se chama decadência convencional e é regulada pelo artigo 211 do Código Civil, que permite às partes estabelecerem um prazo para o exercício do direito que, nesse caso, substitui o prazo legal. Nessa situação, diferentemente da decadência legal, o prazo pode ser modificado, inclusive podendo ser objeto de renúncia pelas partes.
Além disso, enquanto a decadência legal deve ser reconhecida de ofício pelo juiz (art. 210 do Código Civil), a decadência convencional depende da alegação da parte interessada para produzir efeitos, e o juiz não pode declarar sua ocorrência de ofício.
Resumo das exceções em que não ocorre a decadência
- A decadência não corre contra incapazes enquanto durar a incapacidade;
- A decadência pode ser convenientemente ajustada pelas partes por meio de acordo;
- O prazo decadencial legal não admite suspensão ou interrupção, salvo as exceções acima.
Diferenças entre Decadência e prescrição
Decadência e prescrição: Natureza dos direitos e efeitos
- Prescrição: Está relacionada à perda do direito de ação, ou seja, da possibilidade de cobrar judicialmente a pretensão. O direito continua existindo, mas não pode ser exercido judicialmente após o prazo prescricional.
- Decadência: Extinção do direito em si, e não apenas da ação. Após o prazo decadencial, o direito deixa de existir.
Decadência e prescrição: Prazos e possibilidades de suspensão e interrupção
- Prescrição: Pode ser suspensa ou interrompida, conforme causas previstas em lei, o que pode reiniciar ou congelar o prazo.
- Decadência: Em geral, é prazo peremptório e não admite suspensão ou interrupção, salvo as exceções previstas.
Decadência e prescrição no direito tributário
No Direito Tributário, decadência e prescrição são hipóteses de extinção do crédito tributário.
- A decadência é a perda do direito da Administração de constituir o crédito tributário, ou seja, lançar o tributo devido. O prazo decadencial é de 5 anos a partir do fato gerador.
- A prescrição é a extinção do direito da Administração de cobrar o crédito tributário via execução fiscal, após o prazo prescricional, também de 5 anos.
Importante destacar que, se o contribuinte pagar um tributo já prescrito, ele tem direito à repetição de indébito, pois a Administração agiu de forma ilícita ao exigir tributo inexigível.
Fiquem ligados na nossa página para as próximas notícias sobre decadência e prescrição!